A evolução das regras (2)
 
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A evolução das regras (2)

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Thomas ArnoldNa sequência do texto da semana passada vamos continuar a abordar a evolução das regras integrando-a noutras perspectivas de análise.

Uma interpretação histórica

Numa vertente interpretativa histórica, há autores, entre os quais Velázquez (2004), que não deixam de ver nos princípios do fair-play, do amadorismo, do “controlo da distância”, - próprios não só do basquetebol mas de outros jogos desportivos -  valores típicos das classes privilegiadas que vinham sendo defendidos desde a criação do desporto moderno no início do século XIX.

Uma hipótese que nós lançamos explicando a limitação da violência num jogo como o nosso e na sequência das teses de Norbert Elias (1985), será a de considerarmos que desportos como o basquetebol se inserem numa segunda vaga de modernização dos jogos populares. A primeira terá ocorrido no século XIX, nas Public School’s, escolas inglesas privadas reservadas aos filhos da aristocracia e da alta burguesia. Aí, jogos medievais muito populares como a Soule, (apesar da tal proibição repetida de reis, como Henrique II e Henrique IV de Inglaterra) caracterizados por altos níveis de violência, foram objecto de estrita regulamentação e integrados no currículo escolar (a figura tutelar deste período no que concerne à integração educativa dos jogos foi Thomas Arnold). Foi o caso do râguebi e do futebol. Quanto ao basquetebol, pensamos que talvez se possa ver nele mais um passo na sofisticação e no controle da violência. Consideramos válida essa nossa hipótese, principalmente se perspectivarmos o médio prazo. Entrecruzado com este grande movimento civilizacional de fundo em que o desporto se integra como um dos seus constituintes e formas de expressão, é evidente que não devemos deixar de considerar as consequências “educativas” intencionalmente pretendidas nos jovens praticantes escolares dessas classes privilegiadas, tais como a coragem, a virilidade, a liderança e o espírito de equipa (Velázquez, 2004) ou como também se diria hodiernamente, o empreendedorismo.

No entanto e por outro lado, não nos devemos esquecer de certas realidades contemporâneas e lembrar, por exemplo, que pouco tempo depois da sua invenção, já o basquetebol despertava emoções que levavam ao rubro muitos dos seus espectadores. Em vários locais dos E.U.A. os jogos tinham de se realizar com os campos isolados dos espectadores, constituindo autênticas jaulas onde os jogadores evoluíam. E as atitudes de alguns desses espectadores levaram mesmo alguns dos primeiros árbitros a irem para o campo munidos de pistola e a darem tiros para o ar para evitarem males piores (Diaz-Miguel, 1985). Num outro registo negativo, assinalamos que na década de cinquenta, os jogos de basquetebol, ou mais propriamente, os seus resultados, foram alvo de manipulação, já que se faziam apostas que envolviam bastante dinheiro. Por isso jogadores e treinadores estiveram envolvidos nesses fenómenos de corrupção desportiva. Com a institucionalização e a estabilização da NBA, - que se tinha criado em 1946, - e com os jogadores a auferirem rendimentos milionários, o potencial de corrupção perante os jogadores profissionais tornou-se muito menor dado que estes não iriam pôr em risco os seus rendimentos e contratos plurianuais em troca de alguns milhares de dólares. Outros fenómenos negativos não deixaram também de aí existir, como por exemplo o da droga e o da violência, embora tenham sido tomadas medidas muito duras pelos seus gestores de modo a preservarem o “negócio” fabuloso que a N.B.A. representa. Enfim, todas estes fenómenos negativos não são intrinsecos à essência do  basquetebol mas encontram nele formas de expressão pela sua popularidade, tal como acontecem na envolvência de outros desportos similarmente mediáticos.

Entretanto o nosso desporto sofreu uma evolução tremenda dentro e fora do seu país natal. Há já algumas décadas que se pode afirmar que o basquetebol é um verdadeiro mundo dentro do nosso mundo. Aliás, a própria F.I.B.A. orgulhava-se em tempos de ter chegado a ter mais federações associadas do que os países integrantes da O.N.U., com muitos milhões de praticantes federados.

Factores de evolução do jogo

“Na história do jogo, o código modificou-se de tempos em tempos ao mesmo tempo que o próprio jogo. Os seus diversos capítulos só foram adoptados, em diferentes períodos, para resolver os problemas postos pelas maneiras de proceder dos jogadores, e pelas relações entre esses jogadores. A lei não é mais do que a codificação, num certo momento, da maneira de fazer de uma certa época.” (Listello, 1959, p. 49)

Há vários factores que podem contribuir para que um jogo evolua num determinado sentido e não noutro. A alteração às regras é apenas um deles. Aqui, no que diz respeito à temática que delimitamos, poderemos apontar que um dos princípios que deveria ser intencionalmente promovido pelos organismos legislativos e reguladores, - federações nacionais e internacionais -, quando modificam as regras seria o seu potencial formativo, tendo em base estudos e experiências efectuadas previamente. No basquetebol adulto, sabemos hoje em dia que o aparecimento da linha dos três pontos em 1984, constituiu um impulso decisivo para a transformação do jogo num sentido promissor exigindo e criando uma maior riqueza táctico-técnica ao jogo. Além do mais, essa nova regra permitiu criar mais espaços de evolução no jogo, dando hipóteses maiores de sucesso ao ataque.

No entanto, as regras adequadas para a alta competição não o são, necessariamente, para a prática infanto-juvenil. Sem desvirtuar a essência do jogo e mantendo o espírito do mesmo, as adaptações às regras são também fundamentais para o desenvolvimento do praticante (Piñar, 2005). A autora citada, juntamente com outros investigadores espanhóis universitários da área do basquetebol, tem sugerido várias modificações às regras do minibásquete que, fundamentadamente, confeririam à prática do jogo pelas crianças, outro valor formativo. Baseados em alguns estudos de que a tese de doutoramento da autora é um bom exemplo, demonstraram que a alteração da prática competitiva baseada no 5vs5 para o 3vs3, assim como na existência de linhas de três pontos e de lances livres a uma distância mais adequada, assim como de condicionamentos à distribuição do tempo de jogo pelos jogadores, contribuiriam para uma competição mais formativa e igualitária, com uma participação mais activa e variável, designadamente do portador da bola. E modificaria, num sentido positivo o ataque, designadamente no número, tipo e duração dos ataques (Piñar, 2005). Os treinadores franceses Roux e Mimouni (Roux & Mimouni, 2008) apresentaram um pequeno mas interessante estudo onde expõem algumas evidências acerca da influência positiva do jogo reduzido no jogo dos minibasquetistas. Em Portugal, Veleirinho (1995) debruçou-se também sobre a pertinência do uso dos jogos reduzidos no ensino dos Jogos Desportivos Colectivos chegando a conclusões semelhantes. Esta via é, aliás, uma linha já tradicional desde que o modelo de ensino para a compreensão (Bunker & Thorpe, 1982; Thorpe, Bunker, & Almond, 1984) surgiu e sugeriu alguns princípios de adaptação dos jogos aos praticantes. Esta ideia é concretizada através do arranjo de formas de jogo apropriadas ao nível de compreensão e de capacidade de intervenção dos alunos, seguindo determinados princípios pedagógicos (A. Graça & Mesquita, 2002).

Não queríamos deixar por fim de referir um princípio importante na questão do potencial formativo: as regras devem constituir possibilidades abertas aos jogadores e não constrangimentos insuperáveis. A sua adaptação em função do nível de jogo deveria ser uma preocupação constante. Um exemplo disso é a regra da “posse de bola protegida” que vários autores (Barreto, 2001; Amândio Graça, 2004) vêm referindo como fundamental para permitir um jogo adequado aos iniciantes mais débeis. Á medida que o jogador evolui, esta regra deixa de ser necessária aplicando-se a regra normal dos contactos.

Concluímos este breve ensaio dizendo que a alteração regular às regras, quando feitas de modo racional e a partir de estudos prévios, se possível com recurso à experimentação, além de ser uma imagem de marca do basquetebol é uma necessidade absoluta para a melhoria e evolução do próprio jogo em geral.


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