No centenário do seu nascimento
 
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No centenário do seu nascimento

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Pete Newell"Nobody contributed more to this game and it’s history than Pete Newell."
Bobby Knight

Peter Newell, mais conhecido como Pete Newell, nasceu em 31 de agosto de 1915 e foi uma das mentes mais brilhantes que o basquetebol americano e mundial já possuiu. Como criança a sua mãe – como outras desse tempo em Los Angeles - queria à viva força destiná-lo a ser uma figura de Hollywood tendo ele participado em alguns filmes da era muda. Ele por sua vez não gostava nada dessa ideia preferindo jogar basebol sempre que podia. Mas apesar de pelos seus oito anos se ter libertado desse destino que não queria, aqueles que o conhecem dizem que essa experiência de ator o marcou para a vida sendo visível na sua forma de estar e no seu relacionamento público.

Pete NewelNa sua formação escolar e ao nível do High School em particular revelou um nível de excelência em vários desportos tais como o futebol americano, o basebol e o basquetebol, desportos que aliás dirigiu posteriormente como treinador quando desempenhou a nível universitário as funções de diretor desportivo. Depois dos estudos secundários foi logo trabalhar e não seguiu imediatamente os estudos universitários pois nesses tempos pós grande depressão, “o “college” não era um direito mas antes um privilégio.” (Krause & Pim).

Quando entrou na universidade escolheu Loyola em Los Angeles onde jogou para Jimmy Needles. Recordamos que Needles foi o treinador escolhido para selecionador da primeira equipa dos Estados Unidos presente nos também primeiros jogos olímpicos onde houve torneio oficial de basquetebol: Berlim, 1936. Entre Pete e Jimmy havia uma grande cumplicidade. Nas palavras de Pete eles tinham o hábito de se sentarem e falarem de basquetebol e da vida durante quatro ou cinco horas seguidas. Pete reconhece que muitas das coisas que utilizou posteriormente no basquetebol foram-lhe transmitidas por Needles: “the reverse-action, weakside help on defense, the stall, position for the transition game, getting players to thing for themselves instead of relying on timeouts.” (Krause & Pim)

O primeiro lugar como treinador de Newell foi na Academia Militar de St. John’s e aí treinou nada menos do que quatro desportos: futebol americano, basquetebol, atletismo e softball. Em todos esses desportos e durante os dois anos em que lá esteve a escola nunca foi derrotada!

Pete Newel

Em 1942 alistou-se na Marinha Americana, praticou basquetebol e conheceu grandes nomes desse e de outros desportos, um dos quais o lendário Red Auerbach. Dessa época recorda que esteve embarcado cerca de um ano e meio e que quando acabou a experiência se sentiu dez anos mais velho. Relembre-se que estávamos em plena segunda guerra mundial.

Em 1946 aceitou um posto de treinador na universidade de S. Francisco onde orientou basquetebol, basebol e golfe com muito bons resultados. Em 1949 obteve mesmo o National Invite Tournement (NIT) que nesses anos tinha um prestígio enorme no basquetebol americano ao contrário do que acontece mais recentemente em que é um torneio de menor expressão.

Pete NewelO seu modelo de treino baseava-se desde logo em submeter as suas equipas a um intenso programa de condicionamento físico. Como é referido no Naismith Hall of Fame, Pete Newell foi um “master tactician” que estabeleceu um “system of tight, aggressive defense combined with a disciplined, patterned offense.”

Entre 1950 e 1954 esteve na Michigan State University onde melhorou consideravelmente os recordes da escola que até aí tinha uma pobre reputação desportiva tendo em 1951 levado os Spartans a ser considerada a segunda melhor defesa da nação e em 1953 a obter mesmo uma esplêndida vitória contra Kansas State que estava no número um do ranking nacional. Os jogadores em Michigan nunca se esqueceram do impacto que Newell teve neles. Durante 50 anos reuniram-se anualmente para comemorar, rememorar o passado e agradecer ao treinador.

Pete não admitia queixosos nem quem apresentasse pensamentos negativos. Num jogo um dos seus jogadores do “cinco inicial” no final do aquecimento veio para o banco queixando-se dos aros. Logo Newell foi à mesa e pediu uma troca de jogador e comentou para o queixoso: pelos vistos tens uns problemas com a tabela ou com os aros e por isso eu quero tirar-te esse teu problema emocional. Vais ficar comigo aqui ao lado no banco a ver o jogo esta noite. (Krause  Pim; Jenkins). Newell sobre esta atitude testemunhou: “ Eu estava a tentar ensinar-lhe – e a todos os meus jogadores – que não podemos ter tudo o que queremos na vida. Se os aros não estavam bem, que estivessem. Se causavam um ressalto mais longo só havia que fazer um ajustamento.”

Como métodos de treino usava o que ele dizia ser o “part-whole teaching method” (P.M.T). “O P.M.T ensina a um jogador porque é que ele está a fazer alguma coisa. Em jogos 5x5 não estás a ensinar estás a treinar. Partindo o todo em 1x1, 2x2, 3x3 exploram-se todas as opções do ataque e da defesa e os jogadores perceberão o “porquê” do que estás a fazer. E se eles cometerem erros podes chamar-lhes a atenção. Grão a grão enche a galinha o papo. É como o motor de um carro trabalha-se a parte que não funciona, não se deita fora o motor inteiro.”

“Eu comecei o P.M.T. observando o Jimmy Needles mas foi com Tom Hinkle que de facto aprendi o seu potencial quando joguei na sua equipa da Marinha nos Grandes Lagos e até hoje continua a ser a base do meu método de treino”. (Krause & Pim). Newell ensinou na Universidade da Califórnia em Berkeley de 1954 a 1960 e dirigiu os Golden Bears rumo a qualificações consecutivas na disputa das finais do campeonato da NCAA em 1959 e 60, ganhando em 1959 sem ter nenhum jogador All-American nem mesmo nenhum jogador All-Pac-8-Conference. O seu recorde nessa Universidade foi de 119-44.

Newell tinha a particularidade de ficar nos jogos com as mãos a suar imenso e com a boca muito seca. Por isso usava uma toalha seca numa ponta e molhada na outra que mastigava nervosamente. Na ponta seca secava as mãos e na outra ponta ia molhando a boca. Chegou a beber em dois dias 40 copos de café e a fumar seis maços de cigarros. Tomava a última refeição na quinta-feira e depois na sexta e no sábado, dias dos jogos, não conseguia comer mais nada. Era nas palavras dele próprio um desastre emocional. A conselho médico resolveu retirar-se da atividade como treinador depois de 14 épocas ao nível universitário.

Foi o primeiro treinador a obter a chamada “Triple Crown”, isto é o NIT em 1949 (quando este torneio como já dissemos tinha um peso grande no contexto basquetebolístico norte-americano), o campeonato da NCAA em 1959 (que não conseguiu revalidar em 60) e o título olímpico em 1960 em Roma. Só mais dois treinadores conseguiram desde então o mesmo feito (Bobby Knight e Dean Smith).

Foi considerado em 1960 o treinador do ano. Pela sua “habilidade de ensino, inovadoras técnicas de treino e aptidão para avaliar talento” foi considerado no mundo do basquetebol como o “America’s basketball Guru”. (Krause & Pim)

Desde que se retirou da atividade como treinador universitário não deixou de estar envolvido no universo do basquetebol. No basquetebol profissional americano, por exemplo, teve responsabilidades de scouter, general manager e diretor de desenvolvimento de jogadores (idem).

Pete Newel

A sua relação com muitos dos grandes nomes do basquetebol foi muito intensa sendo que era por todos considerado um dos maiores peritos do jogo sendo consultado frequentemente por muitos dos treinadores mais experimentados (existe um documentário – “Basketball Guru” - sobre Newell extremamente interessante em que dão testemunho grandes nomes deste desporto). Bobby Knight manteve com ele uma relação pessoal muito próxima chegando a escrever em parceria dois volumes de um livro técnico. Knight considerava Newell o seu mentor e segundo pai. O discurso de consagração da cerimónia em que Knight entrou para o Basketball Hall of Fame como treinador foi de Pete Newell. Pete tinha entrado para o Hall of Fame em 1979 como um dos contribuidores para o jogo e a sua equipa olímpica de 1960 obteve também esse feito como equipa em 2010, no mesmo ano aliás em que o Dream Team de 1992 entrou para esse mesmo quadro de honra.

Pete Newell passou por muitos países onde falou sobre o nosso bonito jogo. Uma das suas criações foi a do “Big man camp”, campo de formação e aperfeiçoamento de jogadores altos por onde passaram muitos dos grandes postes e jogadores grandes da NBA que foi crescendo e que ainda se realiza com grande sucesso. Tudo terá começado com um trabalho particular com Kermit Whashington que a partir daí deu um salto qualitativo na sua carreira. É de referir que Newell nunca cobrou dinheiro aos jogadores que participaram desse campo. Dessa experiência deixou ainda antes do seu falecimento um testemunho em livro (com respetivo DVD), escrito a quatro mãos com o ex-jogador Swen Nater que se encontra editado em língua inglesa e espanhola. O campo foi estendido em 2001 também a jogadoras posteriormente à sua consolidação com jogadores.

Newell sempre enfatizou imensamente a importância do trabalho de pés. “Eu quero que os jogadores percebam que jogam 100% do tempo com os pés e apenas 10% com a bola”.

Critica o facto de se dar modernamente pouca enfase a este trabalho, menos até do que se dava no passado com consequências negativas para a qualidade dos jogadores. “Sacrifica-se o movimento inteligente e o equilíbrio em relação à capacidade de salto e de força”, diz ele.

Durante a sua carreira escreveu vários livros onde deu conta das suas ideias para o jogo e dos seus processos de treino.

Faleceu com noventa e três anos de idade em 17 de novembro de 2008.


Alguma bibliografia:
Basketball Methods (1962) with John Benington
Basketball: The Sports Playbook (1976)
Basketball Post Play (1995)
Pete Newell's Defensive Basketball: Winning Techniques and Strategies (Art & Science of Coaching) (2001)
Newell, P., & Nater, S. (2008). Playing big. The definitive guide to modern post play. Champaign, IL: Human Kinetics.
Newell, P, & Nater, S. (2011). Juego de los grandes. Badalona: Paidotribo.
Knight, B. & Newell, P. (1985). Basketball According to Knight and Newell Volume 1 and 2.

Sobre Newell:
Jenkins, B. (1999). A Good Man: The Pete Newell Story. Berkeley, Ca: Frog, Ltd.
Krause, J., & Pim, R. (2005). Lessons from the Legends. Basketball offense sourcebook. Chicago: Triumph Books. (Foi neste livro sobretudo em que me baseei para escrever este artigo de homenagem). https://en.wikipedia.org/wiki/Pete_Newell

Entrevista vídeo a Newell onde ele se pronuncia sobre vários aspetos do basquetebol e explica a origem de algumas das suas ideias do jogo ofensivo como o “Reverse action”:
http://www.bing.com/videos/search?q=pete+newell&FORM=VIRE5#view=detail&mid=4702493F3A8A9DE7E0C74702493F3A8A9DE7E0C7

Um Clinic na Youtube com Pete Newell:
https://www.youtube.com/watch?v=jYpg0TL8ydY

Site do facebook do documentário “Basketball Guru”:
https://www.facebook.com/Basketball-Guru-160846750638477/timeline/

Anexos:
Citações de Newell retiradas de:
http://hoopthoughts.blogspot.pt/2008/11/coach-pete-newell.html
On defense: "You start with the fact that there's only one way to play defense. Shuffle your feet, knees bent, hands up."
On developing habits: "I believe you can never change a habit, or create one, with a word or a piece of chalk. You can talk all day, put all sorts of diagrams on the board, but a habit is not going to change. It's a conditional reflex, created by a repetitive act."
On morale: "Morale is something a lot of people talk about, but seldom really address. You've got to practice it, show that you're committed."
On part-method teaching: "Part-method teaching tells a kid why he's doing something. In five-on-five drills you're not teaching, you're coaching. Break it down to one-on-one, two-on-two, three-on-three, go through every option of the offense and defense, and the players will understand why you're doing it. And if they make mistakes, you can point it out. The parts make the whole. It's like your car engine; you work on the sparkplugs or the carburetor or whatever's causing the problem. You don't have to get rid of the whole motor."
On tempo: "We want to make the other team play a game we think we can play better. We do this by making them play at a speed they're not used to."
On emphasizing defense: "Everything to me is calculated toward the defense and letting the players know they can assert themselves."
On reverse-action offense: "A really sound offense will have that variety. With reverse action, we'd have a screener, a cutter, and a passer, and if you have the three minds working together at the same time, you'd get a real good shot."
On criticizing players: "I never berated a player coming off the court or on the bench. I may have raised hell on the practice court, or watching films the next day, and sometimes it was my fault. But I wasn't involved in blaming people. It was why, why, why. Because when you know the 'why' of something, you can do something about it."
On coaching & teaching: "Coaching and teaching are two different things. The coaching never turned me on that much, but I always enjoyed the teaching, the practice sessions."
On little things: "It's little things. Like coming to a jump-stop when you catch the ball inside in post-up position, so now either foot can be a pivot."
Probably no story summed up Pete Newell more than the one Coach Bob Knight shared in his book, "Knight: My Story" when to told of Coach Newell taking the time to visit with Coach Fred Taylor to discuss defense. Coach Taylor was the at Ohio State, with a young Bob Knight on the team. Coach Newell openly shared his defensive philosophy with the Ohio State staff. In 1960 Ohio State defeated Coach Newell's California team in the NCAA championship game and it had a profound effect on Coach Knight:

"What he represented to me in this case was the responsibility a teacher has to share with others whatever he has come up with that he found to be of some benefit. When later I was in a position to do that, I always did. If we were doing something that people were interested in, I never held anything back at clinics or in conversation with fellow coaches, especially young ones."
Bobby Knight

Comentários 

 
+2 #2 Humberto Gomes 27-09-2015 21:18
Prezado Henrique Santos,
Depois de um sábado de "má digestão", em que uma louvável iniciativa, por parte da ABAlgarve,não teve a adesão que justificaria e mereceria, por parte dos agentes a quem a mesma se destinava - sem surpreender, pois trata-se de um mal endémico que talvez um dia se consiga debelar... - , não imagina como me soube bem a evocação de Pete Newell ! Realmente uma personalidade ímpar, a quem o basquetebol tanto ficou a dever. Sabia um pouco sobre ele, e pela via Bobby Knight. Fiquei agora a saber um pouco mais, graças ao Henrique.
Obrigado, companheiro. E continue a brindar-nos com esses brilhantes escritos.
Aquele abraço.


Fico-lhe grato por isso, na sequência, aliás, de belíssimos trabalhos com que nos tem presenteado
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+2 #1 José Almeida 25-09-2015 14:56
Lendo este excelente artigo uma palavra não deixa de me ocorrer relativamente ao Pete Newell e ao autor do artigo: Profissionalism o (com todos os adjectivos positivos que a palavra contém e que são seguramente mais de vinte).
Parabéns Henrique!
Seguramente, tal como eu quando me falaste do Pete Newell pela primeira vez, muitos dos que lerem este artigo e as tuas referências bibliográficas e indicações finais, ficarão com vontade de saber ainda mais sobre este grande treinador e isso terá, com toda a certeza, um impacto muito positivo na sua forma de encarar o jogo e o treino de basquetebol.
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