A competição, na cabeça do atleta, é um dos momentos mais importantes no seu processo desportivo, logo, temos que tornar o momento o mais equilibrado, justo e correcto em termos das regras que a rege.

Nos dois últimos artigos descrevi como se processa parte do modelo de competição usado na formação nos Estados Unidos. Este modelo tem aspectos bastante interessantes em termos do desenvolvimento do atleta, em todas as suas vertentes, mas para além do âmbito desportivo, existem uma série de factores que o tornam compatível.

Comecemos pelo sistema escolar, sistema este que é criado também para que o sistema desportivo tenha sucesso. Não possuo dados para saber se quando criado, pensou-se logo na vertente desportiva, mas o que torna interessante é que ao longos dos anos foram feitas as adaptações necessárias entre os dois sistemas sempre em benefício do aluno/atleta.

Sendo assim, a escola começa às 08:00/08:30 (poderá variar em algumas instituições) e acaba às 15:15, sendo que as actividades extra-escolares começam às 15:30, o que quer dizer que, mesmo que um treino dure 2 horas, às 17:30 o jovem já teve um dia inteiro de aulas e da sua prática desportiva, deixando o resto do dia para dedicar-se ao estudo, lazer e família.

Agora olhemos para o sistema laboral norte-americano. Os horários de trabalho começam às 09:00/09:30 da manhã e duram até às 17:00/17:30 o que permite um pai deixar o seu filho na escola, ter um dia todo de trabalho e quando regressa do mesmo vai buscar o seu filho, que além de ter tido um dia inteiro de aulas, já teve a sua prática desportiva.

Os dois sistemas estão feitos de modo a que se enquadrem um no outro na “perfeição”, sem prejuízo tanto para o pai como para o atleta.

Olhemos agora para o nosso país. Com sistemas de educação muitas vezes interrompidos durante as ditas “reformas” por causa das mudanças políticas, políticas estas nunca pensadas a médio longo prazo, devido a problemas económicos temos cada vez menos professores o que faz com que cada vez mais existam salas de aula com um maior número de alunos. Logo, por consequência, temos cada vez menos escolas, o que faz com que os horários escolares estejam desadequados às reais necessidades. Olhemos agora para os horários laborais, que por norma, são das 09:00 às 18:30/19:00 fazendo com que exista por vezes um espaço de 2 horas entre a saída do aluno da escola e a chegada do pai do trabalho, tempo este que muitas vezes, não só não é aproveitado, como também causa problemas tanto ao aluno como ao pai. Outro ponto importante é o facto dos pavilhões só estarem disponíveis aos clubes depois das 18:30 (sendo que nos nossos dias existe uma enorme percentagem de clubes que utiliza os equipamentos desportivos das escolas) o que nos deixa com o problema dos horários, onde os escalões de sub-14 só treinam depois das 19:00 chegando muitas vezes a casa por volta das 20:30 ou até mais tarde.

Depois deste apanhado podemos concluir que não existe nenhum plano, visão, reforma, ou o nome que pretende dar, para que exista uma saudável cooperação entre o desporto e o sistema laboral, ou seja, entre o trabalho dos pais e o “trabalho” dos filhos, mas até penso que vai muito para além destes dois pontos. Uma reforma do sistema desportivo, promovendo verdadeiras práticas de desporto e actividade fisica adequadas irá fazer com que um jovem, ao longo dos anos, tenha comportamentos saudáveis, longe dos comportamentos sedentários dos nossos dias devido ao desenvolvimento da tecnologia (telemóveis, computadores, internet, consolas, etc), logo menos problemas de saúde, logo menos idas aos hospitais e, logo, menos encargos para o governo.

Sei que tudo isto não é tão linear e/ou fácil de mudar, mas também sei que é tão óbvio de se ver como é que em mais de 30 anos de democracia poucos passos foram dados para se perceber qual a direcção que devemos ir.

Talvez por ser uma pessoa muito positiva e onde, com maior ou menor esforço, sempre consegui alcançar os meus objectivos, sei que estas mudanças no nosso sistema desportivo são mais que possíveis num plano que, obrigatoriamente, tem que ter muito mais do que um par de anos mas completamente atingível.

Andamos a “brincar” ao desporto, olhando para ele, ainda muitas vezes, como “uns quantos miúdos e uma bola” quando o mesmo tem um carácter social, humano e económico enorme numa sociedade.

Temos que reformar as fronteiras territoriais do nosso pais, fazer um levantamento dos clubes e juntar associações, temos reformar os modelos de competição,  sermos honestos e verdadeiros sobre o estado financeiro de cada clube, não fazendo orçamentos com o “que se poderá vir a receber” mas sim com o que realmente se tem, saber os reais custos das competições, das estruturas que organizam as mesmas, trabalhar com as escolas no sentido de aproximar mais as cooperações entre o desporto federado e o escolar, deixar de “prender” uma criança tanto a uma secretaria indo contra a sua própria natureza, dar mais espaço para a prática desportiva e o desenvolvimento da sua criatividade.

Existe sem duvida muito caminho, muito mesmo...mas o bom do estado das coisas estarem como estão é podermos construir do “0” um sistema que esteja adequado à nossa realidade, indo buscar aos vários sistemas dos outros países o que de melhor têm e adaptar ao nosso.

Tenho um amigo meu que me diz “se não fosse fácil não era para ti”, pego nesta frase e digo “ainda bem que não é fácil porque nos obriga a estar mais atentos e focados nos objectivos”.

E, para terminar, como diz António Machado, “O caminho faz-se caminhando...”

Eu Vejo-te...
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