Desenvolvimento desportivo?
 
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Desenvolvimento desportivo?

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Henrique SantosO meu artigo da semana passada suscitou um conjunto de comentários que li com muito gosto, pois apresentaram várias ideias importantes para discutir.

Hoje vou tentar começar por responder apenas àquilo que penso ser o essencial e primário. Penso que se pode resumir no tema do “Desenvolvimento desportivo” em geral e do basquetebol em particular. Este texto tem apenas a pretensão de carrear algumas notas para debate.

Em primeiro lugar, esta temática tem sido recorrentemente abordada por vários dos autores que escrevem no Planeta Basket. Reporto-me, por exemplo, a toda a série de escritos de San Payo Araújo abordando a organização regional do basquetebol em Portugal, onde inclui várias propostas concretas, muitas delas não consensuais; e a apresentação pelo Nuno Tavares dos modelos do basquetebol Espanhol e Norte-Americano ao nível da sua organização.

Há duas vertentes relacionadas no desenvolvimento desportivo de qualquer país e desporto: a quantidade e a qualidade. Quantidade e qualidade de praticantes, de organismos organizadores; de dimensões da prática. Muitos fazem depender a qualidade da quantidade. É a teoria da pirâmide desportiva que segundo creio remonta ao barão Pierre de Coubertin, grande impulsionador do desporto e do renascimento dos Jogos Olímpicos modernos em Atenas, em 1896. De facto o bom-senso leva-nos a dizer que quanto mais praticantes houver, mais probabilidade existe de que no seu seio se revelem talentos. Por outro lado a possibilidade de todos aqueles que queiram e possam praticarem desporto é uma prova de democraticidade e promoção desportiva positiva em si, ao nível da sociedade.

Mas na verdade, alguns políticos com responsabilidade na governação do desporto, pensaram e rapidamente descobriram que se fizessem uma aposta muito mais restrita em certos indivíduos, pré-selecionados, poderiam também obter resultados de elevado nível medidos pela bitola dos títulos. Levaram a cabo acções de deteção de talentos em praticantes de idades precoces e a partir do grupo restrito de selecionados, apostaram neles quase exclusivamente, investindo em estruturas de enquadramento de treino com as melhores condições possíveis. Daí chegaram mesmo à conclusão, cinicamente, na minha opinião, que este era o caminho do “desenvolvimento desportivo.” Dando exempos concretos: não foi verdade que Portugal e outros países conseguiram obter alguns excelentes resultados em algumas modalidades, futebol por exemplo mas não só, sem que houvesse uma verdadeira política de desenvolvimento desportivo generalizado? Por vezes, baseando-se em alguns indivíduos especialmente dotados e com uma grande dedicação ao treino, conduzidos por bons treinadores (ou alguns  experimentalistas que em terra de cegos são visionários ou que estavam dispostos a fazer tudo, mesmo o que nunca deveriam fazer) conseguiu-se produzir campeões. Aconteceu em Portugal, ainda acontece, assim como aconteceu noutros países em que, reconhecidamente não há uma política desportiva digna desse nome.

Dou desde já a minha opinião. Embora o caminho possa ser mais longo e difícil, considero que um país deve apostar por uma política desenvolvimento desportivo generalizado. Ao mesmo tempo, dentro dessa política, considero que tem cabimento o apoio especializado aos indivíduos ou equipas que tenham óptimas condições para o alto rendimento. Essa política deve ser planificada. Deve partir de análises da realidade e ter uma filosofia definida, apresentar metas e objectivos a atingir, especificar meios consignados e formas de avaliação adequadas. Estranhamente, embora sejamos hoje um país indubitavelmente mais rico do que há 38 anos  - fazendo fé no PIB per cápita - parece-me que não se faz agora o que se fez nessa altura e que é algo do mais elementar bom-senso: elaborar Planos de desenvolvimento desportivo. Ontem reli um que foi elaborado em 1974 por uma comissão de treinadores de basquetebol mandatada pela Direção Geral dos Desportos da altura. Era constituída, essa comissão, por cinco treinadores de reconhecida competência: Teotónio Lima, Olímpio Coelho, Jorge Araújo, Hermínio Barreto e Júlio Carlos da Silva. Reli todo o texto mas bastaria ler o índice para desde logo ter uma ideia da dimensão importante que se pretendia realizar. Esse belíssimo plano foi elaborado por portugueses para Portugal. Eram indivíduos que conheciam já na altura outras realidades internacionais do desporto e do basquetebol, onde com certeza recolhiam ideias interessantes e úteis. Nesse plano, contudo, estavam a pensar concretamente na realidade portuguesa. Nele o basquetebol inseria-se numa visão global do desporto em Portugal. Aliás, há que informar que foram elaborados múltiplos planos de desenvolvimento para muitos dos desportos existentes. O desporto era neles visto como uma componente da Cultura.

O plano referido abrangia desde o Basquetebol escolar, o Recreativo e de Manutenção, ao de Alto Rendimento, passando pelo de Formação e Média Competição. Perspectivava a criação de várias estruturas de concepção,  organização e apoio da prática que à altura não existiam. Partia de análises quantitativas que encontrava disponíveis e a partir delas alinhava objectivos. Posto isto apetece-me perguntar: hoje, fazem-se planos destes? Será que não são precisos ou importantes? Hoje, o basquetebol é concebido como parte integrante da Cultura do nosso povo?

Gostaria de suscitar, da parte dos leitores, algum debate. Por exemplo, um dos autores do plano que referi, o Júlio Carlos Silva, honrou-me aqui há semanas por comentar um texto meu sobre a a forma como o grande treinador Lou Carnesecca ensinava as técnicas do basquetebol. Gostava de o ver dar a sua opinião sobre esta problemática. Ele ou outro dos seus autores que fazem parte da nossa vitrina de pessoas verdadeiramente importantes no basquetebol. Infelizmente penso que alguns dos nossos treinadores mais experientes e históricos não estão a ser ouvidos com atenção. Alguns deles ainda estão ainda em actividade. Eles poderiam dar contributos valiosíssimos para o futuro da modalidade em Portugal. Cabe aos mais novos e aos responsáveis pelos organismos políticos e especificamente desportivos que gerem os desportos solicitar-lhes esse contributo.

Fico hoje por aqui esperando os vossos comentários ou, quem sabe, artigos mais desenvolvidos e feitos por pessoas muito mais competentes do que eu. Gostava apenas de dizer que não alinho em críticas que consideram que tudo está mal no nosso basquetebol. Há muita coisa boa, a começar em muitas das pessoas nele envolvidas: jogadores, treinadores, dirigentes, árbitros, seleções, clubes. Falta sobretudo em primeiro lugar uma visão de conjunto, uma organização, enfim, aquilo a que alguns chamam uma política desportiva digna desse nome e trabalho consequente para a concretizar.

 

Comentários 

 
+2 #3 Henrique Santos 10-05-2012 21:25
Ao Nuno Tavares tenho a dizer que também acredito que só um "Desporto assim" vale realmente a pena.
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+5 #2 Nuno Tavares 10-05-2012 14:01
Parte 2
2º Políticas sustentadas de desporto e actividade física para a população, criação de hábitos e cultura desportiva a médio longo prazo irá fazer com que tenhamos um povo mais saudável e com menos problemas de saúde, logo, menos visitas a hospitais, menos gastos em medicamentes, menos encargos do estado nestas áreas. Depois voltamos à questão do desporto federado, de competição, de alto rendimento, importantíssimo na sociedade...mas tal como uma casa, estes aspectos que referi atrás são andares de cima e telhado, não são fundações e rés do chão...acredito profundamente (e no futuro até posso pensar de outra maneira...) que sem a base sólida, sem projectos a sustentáveis de como o desporto e prática desportiva abranja o PAIS TODO, que seja alicerçado nas necessidades reais das pessoas, com um debate geral, e que seja conduzido por quem esteve ou está dentro do desporto, sem medo pensarmos de modo diferente e acima de tudo, sermos sérios...eu acredito num desporto assim!
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+5 #1 Nuno Tavares 10-05-2012 13:50
Parte 1 - Mais uma vez parabéns por mais um excelente artigo. Vamos por partes...sem dúvida que existem países que, sem nenhuma "política de desenvolvimento " conseguem medalhas de ouro e botas de ouro...mas o no inicio do artigo refere - "Por outro lado a possibilidade de todos aqueles que queiram e possam praticarem desporto é uma prova de democraticidade e promoção desportiva positiva em si, ao nível da sociedade." - aqui é que está a questão essencial, que caminho queremos? queremos ter meia dúzia a praticar, centrando as atenções e recursos neles, esperando resultados? Ou queremos que o desporto seja, entre muitas coisas, uma escola de valores (verdadeira e não só dizer o "chavão" e não aplicá-lo), promova saúde, seja algo que estreite cada vez mais diferenças sociais, raciais e de pessoas com problemas físico/mentais? Em Portugal ainda não se percebeu duas coisas essenciais no desporto em geral: 1º não existem formulas mágicas...o retorno leva anos a chegar;
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