Foi com um dos grandes mestres do ensino do basquetebol, o Professor Hermínio Barreto, que no longínquo ano de 2000 aprendi, que na fase de iniciação do jogo, deveríamos dar espaço ao conceito de proteção ao portador da bola.
Ainda me lembro da metáfora que o saudoso professor utilizou para explicar a proteção ao portador da bola. Se nós queremos que uma criança ou um jovem comece a interessar-se e a entusiasmar-se pela pesca, devemos levá-lo a um lugar onde a probabilidade de apanhar um peixe seja elevada.
De outra forma, se a criança estiver a tarde inteira sem apanhar um peixe, nem sentir o peixe picar o isco, certamente não vai querer voltar. Desta metáfora, não podemos nem devemos concluir, que as crianças não têm também que saber lidar com o insucesso. Saber lidar com as adversidades é um ato de inteligência. Encontrar o equilíbrio é uma boa forma de aprendizagem, que é certamente o mais importante para quem ensina e que está a aprender o que quer que seja.
Que fique claro que estamos a falar apenas da fase de iniciação, da fase em que a criança ainda dificilmente domina o que é essencial para poder jogar. Contudo, uma vez mais, uma coisa é o que o professor disse e a outra é como foi interpretada. Quando para interpretar o pensamento do professor de uma forma simplificada dizemos a uma criança não podes roubar a bola, erro que também cometi, mas rapidamente compreendi, que a comunicação sobre a proteção ao portador da bola não poderia ser essa. Essa forma de comunicação pode tornar os defensores passivos, algo que é errado.
O que eu passei a dizer para o defensor foi, tens de impedir que o atacante, que estás a defender, passe por ti e vá para o cesto, passe a bola ou lance ao cesto, mas não podes arrancar a bola das suas mãos. Com estas indicações a criança aprende muito mais sobre a forma de defender, do que simplesmente poder tirar a bola a quem ainda tem poucos fundamentos.
Pego na metáfora do professor para narrar uma situação que presenciei no exercício das minhas funções como diretor técnico nacional do minibásquete. Para não susceptibilizar ninguém, não vou mencionar nem o local nem os clubes envolvidos. Há muitos anos fui convidado por uma associação para ir assistir a uma concentração de minibásquete destinada a Mini-12.
Num determinado jogo, de um lado estava um clube referência, com largas tradições no minibásquete com uma equipa com praticantes já com diversos anos e do outro lado estava uma equipa duma escola, que pela primeira vez estava a participar numa atividade de minibásquete. Escusado será dizer que o jogo se limitava a ser uma criança a tentar meter a bola em campo e outra a roubar a bola e a lançar ao cesto. Durante largos períodos do jogo só aqueles dois tocavam na bola e nas raras vezes que o jogador da equipa da escola conseguia meter a bola em campo, logo um dos adversários roubava-lhe de imediato a bola.
A estória tem mais particularidades que nos deviam fazer refletir, mas para não me alongar vou dizer como, face àquele quadro profundamente constrangedor, agi. Perguntei aos dois treinadores se podia ser eu a arbitrar. Com a anuência de ambos os treinadores informei todos os participantes no jogo, que tinham que impedir que o adversário fosse para o cesto, tinham de conseguir interceptar passes e levantar as mãos, quando havia tentativas de lançar ao cesto. Face às novas regras a equipa da escola conseguiu algumas vezes chegar ao cesto contrário e conseguiu sem nunca ter marcado, por vezes, lançar ao cesto.
O jogo terminou mais de cem a zero e no final perguntei ao treinador da equipa mais forte em que situação é que os seus jogadores tinham aprendido mais do jogo.Na fase em que o jogo, no fundo não era jogo, os adversários nem conseguiam repor a bola, ou quando comecei a arbitrar o jogo. A resposta foi na segunda situação, mas que no quadro anterior teria ganho por muito mais e as crianças gostam de bater recordes. A minha resposta sim é verdade, mas nesse caso não me podes vir dizer que a tua principal preocupação é ensinar.
Eu bem sei que este é um caso extremo, mas com esta pequena estória só quero realçar que conceitos, como o roubo da bola em todas as circunstâncias e a todo o custo encarados como única forma de ensino do jogo e descontextualizados, podem levar a situações em que praticamente não existe aprendizagem para ambas as equipas. Já ouvi António Carrillo dizer: No minibasquete os treinadores devem ser responsáveis por todas as crianças em campo, as da sua equipa e as da equipa adversária. Se a memória não me falha, a equipa da escola deixou de participar nas atividades de mini.